23abril 2018

Aprovações

Nas tuas imediações, ela aprova tua mania de limpeza, tua fala invariavelmente mansa, tua pressa em pular da cama na manhã de um sábado.

Nos teus arredores, ela aprova teu perfume, aplaude teu bom gosto, sorri com tuas cores e se diverte com teu jeito moderadamente amargo.

Em teus subúrbios, ela aprova teus cantos, teus lugares, teus sofás e te acompanha em todos eles, sem alongar os lábios pra frente.

Em tua cidade ela se adequou a uma realidade aparentemente de mão única, seguiu viagem e – alguns muitos quilômetros à frente – encontrou em você a bifurcação que ela tanto precisava para se perder.

Em minhas adjacências, marcou presença no asfalto onde deixo meus rastros. Perfumou as ruas que hoje passo com teu aroma doce feito baunilha… Pintou, pichou, grafitou e deu arte a um coração rabiscado por antigas rasuras.

Em minhas proximidades, alertou o meu ego de que meu cenário mudaria totalmente de sentido, cores e formatos. Transformou os quadrados dos quarteirões que caminho em arredondados entrelaces de mãos ou passeios de moto com palavras de um futuro bom abafado pelos nossos capacetes.

Ela aprova o asfalto rachado dos meus tropeços. Aprova as ruas cimentadas irregularmente pelas minhas derrapadas. Aprova o desgaste do muro, envelhecido por manias que se renovam. Ela aprova a guia rebaixada, o poste quase caindo, a fiação horrorosamente enroscada.

Ela aprova tudo isso porque já provou outras pradarias, outras planícies, outros arredores, mas foi nas tuas provas que ela notou que a vida pra ser bem vivida, precisa ter a qualidade de vida proposta por um amor em construção.

Sem amor não existe rua, calçada, bairro, prédio, vida, muro, poste…

Sem amor, a gente finge que vive até o dia de morrer.